quinta-feira, outubro 06, 2011

Sobre estar faminto e insatisfeito

 
Stay hungry, stay foolish (STEVE JOBS, 2005).

Eu queria viver de criatividade. Porque acho que são os criativos (sempre) que movem o mundo. Eu poderia ajudar as pessoas com a criatividade que vem sendo talhada no percurso da minha história de vida. No meu ofício atual eu uso minha criatividade como posso, dentro dos limites humanos e organizacionais. Com isso eu também ajudo as pessoas. Mas não é mais suficiente.
Ontem, eu conheci uma pessoa que se foi e que está a anos luz de distância da minha vida. Até ontem eu não sabia nada de sua história. Eu não sabia escrever nem seu nome. Como todo mundo que é afeito à criatividade, fui movida pela curiosidade. Ao pesquisar sobre a vida de Steve Jobs senti um grande pesar com sua perda. Repito. Eu não o conhecia. Só sabia o que minha irmã, bacharel em computação, falava aqui e acolá e que muitas vezes eu nem ouvia direito. Mas quando eu percebi o tamanho da pessoa e da genialidade dele, eu me entristeci.
Eu não sei se esse pesar é fruto da minha TPM que não deixa barato nunca, ou se é uma repercussão das minhas próprias angústias profissionais e pessoais. Na minha pesquisa, eu assisti a um vídeo icônico sobre seu discurso em uma formatura na Universidade de Standford. Eu fiquei comovida com as palavras do desconhecido Steve Jobs. Por alguma razão, (que consciente ou inconscientemente eu sei qual é) aquelas palavras me tocaram. Mexeram com as minhas insatisfações. Eu tive vontade de chorar e de escrever. Porque ele me lembrou que eu gosto mesmo é de mexer com a criatividade e com a arte.
Eu planejo, um dia, ter tempo e saúde pra viver a minha arte. Eu penso em fazer um curso de designer de moda. Eu penso em fazer um curso de arquitetura. Eu penso em fazer um curso de gastronomia. Eu penso em fazer um curso de fotografia. Eu penso em voltar a desenhar e em fazer um curso de desenho pra me aperfeiçoar. Mas só quando me estabilizar profissionalmente. Só depois do mestrado, do doutorado, pós-doutorado e livre docência. Só depois de passar num concurso pra professor universitário. Só quando a idade me forçar a viver de hobbies. E eu nem tenho coragem de fazer os cálculos pra saber quanto tempo mais vou ter que esperar.
No discurso, Steve Jobs diz que precisamos fazer o que amamos, porque é isso que vai preencher a maior parte do tempo de nossas vidas. Que só podemos ligar os pontos do passado e confiar que alguns pontos, no futuro, serão ligados de alguma forma e saberemos a resposta. Isso é otimismo. Isso é fé. E isso me fez (re)pensar os meus planos.
Eu preciso com urgência fazer o que amo. Eu não sei mais se amo mesmo o que faço. Essa dúvida vem me adoecendo de culpa e insatisfação há um ano e meio, sendo que eu estou formada há apenas dois anos. É cedo? Quem sabe? Talvez não se eu disser que me sinto como uma pessoa de 180 anos. Dois anos é nada. 
Eu me ressinto da vida adulta. Da rotina burocrática de seguir uma carga horária estipulada pra custear meus sonhos, projetos e necessidades básicas no fim do mês. Eu me ressinto de ter que seguir uma rotina imposta. Eu me ressinto de ter que acumular títulos pra competir no mercado de trabalho. Eu me ressinto principalmente porque muitas vezes eu me vejo na obrigação de acumular títulos apenas pra este intuito e não porque haja amor nas minhas produções científicas. Eu me ressinto de ter que enfiar feitos relevantes da minha vida acadêmica no Currículo Lattes. Eu me ressinto de que nesse caminho o amor por minha profissão esteja cada vez mais embotado e passe a me render mais dissabores que prazer.
Se eu vivesse de arte, provavelmente não conseguiria pagar minhas contas. Provavelmente sentiria culpa em abandonar uma vida acadêmica promissora. Provavelmente duvidaria da escolha de deixar uma vida de tantos investimentos pra trás. Por outro lado eu me sentiria mais feliz. Mais livre. Mais saudável. Teria mais tempo pra minha família, pra meus amigos: os que estão perto e os que estão longe, pra meu afilhado e pros filhos que terei. Mas são os filhos que terei que me lembram que eu preciso sustentá-los através da minha vida burocrática. Provavelmente deixaria produtos mais proveitosos e cheios de amor do que artigos científicos. Provavelmente problematizaria mais, solucionaria mais problemas e talvez nem precisasse de terapeuta pra segurar minhas inseguranças e minhas feridas narcísicas.
Quando digo que queria  ter nascido rica não é pra permanecer na acomodação. É pra viver da arte que sei e da arte que pretendo aprender a fazer. Porque se a criatividade movimenta o mundo, nos movimenta também. Nos faz sair do lugar. Mas sem dinheiro pra bancar a vida que a gente é obrigado a levar a arte se torna uma preocupação. E isso é chave de todo o adoecimento pelo qual tenho passado. Eu estou num impasse. Talvez não seja possível carregar dois pesos ao mesmo tempo. Talvez a minha escolha se enquadre apenas no que é aconselhável. Talvez por isso eu tenha essa sensação de não pertencimento a essa vida adulta protocolada.
Steve Jobs sem saber, sem que eu soubesse, mexeu na minha ferida. Abriu o curativo que eu preservo com esforço hercúleo e por um segundo me fez acordar com a dor. Steve Jobs me fez ter vontade de escrever sobre ele e sobre mim. Eu não precisaria saber de toda sua vida a minha vida inteira. Eu só precisei do dispositivo da curiosidade e de 14 minutos de um vídeo que eu nem teria interesse em ver se ele estivesse vivo. Minha admiração não é mais pelas invenções que ele deixou. Não é mais pela revolução que ele causou no mundo. Não é mais por sua genialidade. Porque até ontem eu nem me dava conta disso. É pela sabedoria que eu vi em suas palavras naqueles 14 minutos de fala que poderiam ainda ser desconhecidos pra mim. É pelo movimento que provocou em mim. Quando ele disse “permaneça faminto, permaneça ignorante” ele me impulsionou a pensar a minha vida, com a ajuda da TPM ou não e me impulsionou a escrever, a usar a arte que eu sei fazer e que promove amor em mim. É por isso.

4 comentários:

Raimundo Neto disse...

E é por isso que eu acredito na sua arte. De verdade!
(Nem sei se dizer isso ajuda!)

Espero que ela, a arte, continuei viva em ti!

Beijos!

Leilianne disse...

comovente!

Anônimo disse...

É difícil e corajoso fazer o que gosta. Seria grande apreciador da sua arte!

Andréa Marx disse...

Poxa JANNA, tb parei pra pensar com o discurso dele e com teu texto! Estamos no msmo barco... só me falta a coragem!!! =(
Viva Steve Jobs!!!